Com 25 anos de existência, a Casa do Beco celebra, em novembro, o mês da Consciência Negra e o dia da Favela (4 de novembro) com a estreia do espetáculo “Na Linha do Meu Lembrar”. Durante a temporada de estreia, o espetáculo terá apresentações abertas ao público, nos dias 3 a 6 de novembro. A retirada de ingresso é pela Sympla. O trabalho tem como proposta homenagear os saberes ancestrais periféricos, reverenciando os mais velhos da comunidade, que ainda guardam em suas lembranças as tantas lutas empreendidas para que as comunidades do Morro do Papagaio, Vila Estrela e Barragem Santa Lúcia (e, em diferentes momentos, Vila Bicão e Vila São Bento – removidas pelo projeto Vila Viva) se constituíssem, formando o que hoje é conhecido como Aglomerado Santa Lúcia.

A montagem foi construída com a participação dos quatro elencos artísticos da Casa do Beco, que atuam nas áreas do teatro, da dança e do audiovisual. O público pode assistir gratuitamente as apresentações da temporada de estreia nos dias 3 a 6 de novembro no teatro da Casa do Beco – Av. Artur Bernardes, 3876 – Barragem Santa Lúcia (Em frente ao Campo de Futebol da Praça Jornalista Eduardo Couri).

Buscando preservar, através das lembranças, o legado daqueles que vieram antes, na Linha do Meu Lembrar é um espetáculo poético, dinâmico e divertido, que busca costurar, em um mesmo tecido de vivências, o antigo e o novo, o particular e o universal, a sabedoria popular e a produção acadêmica, as artes visuais modernas e as tradições teatrais, a realidade e a imaginação, as conquistas do passado e os sonhos de futuro.

A montagem é fruto de um extenso processo de pesquisa que envolveu tanto a leitura de livros, teses e artigos relacionados à memória, ao tempo e à história das favelas e da cidade de Belo Horizonte, quanto entrevistas gravadas em áudios e em vídeos com pessoas da comunidade, artistas, agentes culturais e lideranças locais, assim como antigos presidentes das Associações de Moradores.

Obras como Performances do tempo espiralar, poéticas do corpo-tela, da Doutora em Literatura Comparada, Leda Maria Martins; O Tombamento do “Casarão da Barragem” e as Representações da Favela em Belo Horizonte, da Doutora em História, Josemeire Alves, e Assim era a minha Favela no tempo das seis sirenes, de Luiz Costa, advogado e Presidente da Associação dos Moradores da Vila Santa Rita de Cássia nos anos de 1979 a 1982, constituíram o rico repertório de pesquisa que inspirou a Diretora e Dramaturga, Liliane Alves.

A complexidade que a peça busca representar exigiu um cuidadoso processo de pesquisa, porque se trata de levar para o palco a identidade de toda uma comunidade que foi sendo construída ao longo de um tempo, na sua interface com o poder público e a história de Belo horizonte”, afirma Liliane Alves, que procurou conciliar fatos históricos e vivências pessoais dos entrevistados, em uma narrativa repleta de imagens oníricas e simbologia poética – “Se por um lado, eu recorri a leituras de cunho filosófico e acadêmico, para debater sobre a memória e seus mecanismos de lembrar e esquecer, por outro, a peça tem como objetivo sensibilizar o público para as poéticas cotidianas que podem ser encontradas na história de vida dessas pessoas que lutaram para ser reconhecidas em seus direitos, comentou Liliane Aleves.”

Mestre em Teoria da Literatura pela UFMG, Liliane diz ter ficado muito impressionada com as histórias que recolheu durante as entrevistas realizadas com os moradores, como a de Dona Miltes, líder comunitária que reservava um quarto no quintal de sua casa para abrigar pessoas que chegavam do interior, em busca de uma vida melhor na cidade, e que não tinham onde ficar.  Ou como a das mulheres negras da Vila Estrela que, durante anos se reuniram em um barracão para rezar por si mesmas, por seus filhos e pela solução dos problemas que enfrentavam na comunidade, tendo o desejo de um dia verem no local “uma igreja de verdade” e que foi, de fato, conquistada, em 2008, depois de muita venda de rifas, bingo e conquista de doações empreendidas por elas. “São histórias de vida muito inspiradoras e que nos impactam, por serem carregadas de luta, coragem e senso de irmandade.”, observa a Diretora do espetáculo.

Para dar visibilidade ao que chamou de poéticas do cotidiano, Liliane Alves recorreu ao Teatro de Sombras, Projeção de imagens em vídeo e à criação de uma personagem com o uso de máscara, confeccionada especialmente para a peça. Como recurso que amplia, desloca ou sublinha uma realidade, a máscara foi utilizada no espetáculo para dar vida a uma avó mítica, que, sendo guardiã do tempo, ora simboliza as velhas anciãs, geradoras de vida e sabedoria, dos contos mágicos universais e ora reúne em si o conjunto de pessoas que assumiram papéis significativos e de liderança dentro da comunidade. Em torno desta personagem, a dramaturgia do espetáculo apresenta, assim, uma narrativa capaz de conciliar tanto a retratação de uma realidade local e particular, quanto à discussão sobre temas universais, como o envelhecimento, a passagem do tempo, a morte e os impulsos humanos de sobrevivência.

Além da confecção da máscara, dois estandartes, que reproduzem a paisagem da favela em dois momentos históricos distintos, foram pintados pelo artista plástico Valentinopelé. No espetáculo, os estandartes têm como objetivo homenagear os diversos artistas da música, teatro, dança, esporte, etc, que nascem e moram no Aglomerado. Muitas vezes não reconhecidos, esses tantos artistas, que não tiveram seus rostos reproduzidos, mas simbolicamente representados pelas imagens e cores da favela, são, assim, carinhosamente lembrados e reverenciados. A convite do elenco, Valentinopelé, que é morador da Barragem, pintou um estandarte especialmente para o espetáculo, batizando-o com o nome da peça, e reproduziu uma obra do também artista e morador da comunidade José Agostinho Lucas, conhecido como Coelho Pintor. Falecido nos anos 90, Coelho, já teve quadros vendidos no exterior e retratava, em suas pinturas, o estilo de moradias e o modo de vida do Aglomerado dos anos 60.

Já a proposta de reunir no palco os atores, bailarinos e videomakers que compõem os quatro elencos artísticos da Casa do Beco – Cia Movimento do Beco, Cine Beco, Grupo do Beco e Grupo Teatro Entre Elas – surgiu há algum tempo, quando os gestores da instituição propuseram aos artistas o desafio de atuarem, juntos, em um mesmo espetáculo, a fim de celebrar os vinte e cinco anos de trajetória da Casa do Beco, completados no ano passado. Aceito o desafio, alguns destes artistas se debruçaram sobre a escolha do tema para a nova montagem e compreenderam que honrar a trajetória de luta dos primeiros moradores e lideranças comunitárias locais era também uma forma de homenagear o trabalho de fomento artístico, cultural e de desenvolvimento humano que a Casa do Beco vem realizando dentro e fora do Aglomerado Santa Lúcia, ao longo de sua existência.

“Durante as primeiras discussões sobre a peça, a gente entendeu que seria muito desafiador estarmos todos juntos em um mesmo espetáculo, porque cada grupo aqui da Casa sempre trabalhou de forma independente, produzindo os seus próprios trabalhos. Mas, depois, a gente entendeu que o fato da gente se reunir e juntar as nossas experiências era uma situação muito semelhante ao que fez com que a nossa comunidade se mantivesse em pé até hoje. Porque foi a força da união que construiu tudo isso aqui e é isso que a gente tá tentando mostrar neste espetáculo”, afirma Fernanda Carvalho, atriz e integrante do Grupo do Beco.

O espetáculo é realizado com recursos da Lei Municipal de Incentivo à Cultura de Belo Horizonte (Projeto 0272/2019), sob patrocínio da MGS e Lei Federal de Incentivo à Cultura (PRONAC 204880), patrocínio do Instituto Unimed-BH, viabilizado por mais de 5 mil médicos cooperados e colaboradores, bem como pela Equinox Gold.

SOBRE A CASA DO BECO

A Casa do Beco está localizada aos pés do Morro do Papagaio/Aglomerado Santa Lúcia, na região Centro-Sul de Belo Horizonte-MG e foi criada em 2003. O espaço surgiu a partir do trabalho artístico do Grupo do Beco, criado em 1995. Ao longo desses anos, a instituição tem atuado com o foco na pesquisa artística sobre o morador de favela, buscando retratar, em suas atividades, a perspectiva dessas pessoas, colocando em debate os estereótipos de violência e os estigmas da miséria. Tem em seu Núcleo de artistas, atualmente, além do Grupo do Beco (teatro), a Cia Movimento do Beco (dança), o Teatro Entre Elas (teatro) e o Cine Beco (audiovisual). Além de produções próprias, a programação da Casa conta com a participação de artistas e grupos artísticos da cidade e de fora; sendo composta também por atividades de formação artística e técnica na área cultural, voltada para público de variadas idades, especialmente junto a moradoras e moradores da comunidade. A Casa do Beco é um Ponto de Cultura desde 2009. Mais informações sobre o trabalho podem ser acessadas no site da instituição: www.casadobeco.org.br.

NA LINHA DO MEU LEMBRAR (TEATRO, 2022)

SINOPSE: 

Na roda da saia rendada de vovó, o tempo desfia seu rosário de histórias. E em cada giro de sua ciranda de lembranças, uma comunidade se refaz, revivendo memórias de lutas e conquistas. O espetáculo “Na Linha do Meu Lembrar” é uma homenagem àqueles que primeiro habitaram os mares de morros da cidade, uma reverência aos saberes ancestrais e à gente simples que, subvertendo a lógica da exclusão, persiste em conquistar o seu direito de pertencer.

FICHA TÉCNICA:

Elenco

Grupo do Beco: Alexandre Souza, Erlon Vital e Fernanda Carvalho

Atriz convidada:  Cândida de Jesus

Participação em vídeo: Carol Oliveira

Participação em áudio: Maria Vitória de Oliveira Vital e Cândida de Jesus

Depoimentos em vídeo – Grupo Teatro Entre Elas:  Adeguimar Alves, Ana Oliveira, Cruzelina de Oliveira, Du Carmo Fernandes, Júnia Leonel, Maria das Graças Dias, Maria das Mercês Silva, Maria Geralda de Paula, Maurina Silva, Milta de Oliveira, Rita Cardoso, Rosalina Cardoso, Suzete de Sousa.

Direção: Liliane Alves

Dramaturgia: Liliane Alves (em processo colaborativo com o elenco)

Coreografias: Cia Movimento do Beco

Direção de Coreografia: Amanda Gonçalves

Assistente de Coreografia: Carol Oliveira

Produção Audiovisual: Cine Beco

Captação de Imagem e Edição de vídeos: Gabriela Matos

Captação Sonora dos Vídeos: Pris Campelo

Pesquisa: Liliane Alves

Cenografia, Cenário e Figurinos: Fabiana Martins Mouchrek

Tingimento de tecido para projeção: Claudio Omir

Criação e Confecção de Máscara: Rafael Bottaro

Artista Plástico: Valentinopelé (Criação do Estandarte 1, intitulado “Na Linha do Meu Lembrar” e Cópia de Obra do artista Coelho, sem título, para Estandarte 2).

Criação e Edição de Trilha Sonora: Tonn Alvarenga

Workshops de Preparação

Teatro de Sombras: Débora Mazochi

Teatro de Máscaras: Marcelo Alessio 

Caracterização de Personagem: Sol Zofiro 

Videomapping: O Bob da Maria

Cantos e Tradições do Reinado: Fábio Felipe Evaristo – Capitão de Reinado na Irmandade de Congo e Moçambique de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito

 

Vivência Reinadeira: Guardas de Congo de São Benedito e de Moçambique da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário do Jatobá

Criação de Luz: Doni Oliveira

Técnicos de Som e de Luz: Doni Oliveira e Igor Amado

Cenotécnico: Nilson Alves

Fotografia para o Programa e Imprensa: Gabriela Matos

Designer Gráfico: Fabiana Martins Mouchrek

Coordenação de Produção: Janete Pinheiro

Assessoria de Imprensa: Aline Barbosa

::SERVIÇO::

Evento: Espetáculo teatral NA LINHA DO MEU LEMBRAR (Temporada de Estreia)

Quando:

03, 04 e 05 de novembro de 2022 (quinta a sábado), às 20h

06 de novembro de 2022 (domingo), às 19h

Local: Casa do Beco – Av. Artur Bernardes, 3876 – Barragem Santa Lúcia (Em frente ao Campo de Futebol da Praça Jornalista Eduardo Couri)

Valor: Gratuito | Entrada franca

Garanta seu ingresso pelo Sympla, ou retire-o no local, 1 hora antes do início do espetáculo. Sujeito a lotação do espaço.

www.sympla.com.br/espetaculo-na-linha-do-meu-lembrar__1761084

Classificação: Livre

Duração: 1h15

Como Chegar: Ônibus – linhas 101, 8101, 8103, 9101, 1170 – S20