Segundo dados do relatório público do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (Sisvan), do Ministério da Saúde, de 2008 a 2021, a taxa de obesidade infantil no Brasil cresceu 70%. Esse aumento exacerbado também se deve ao fato da pandemia da covid-19, que potencializou os fatores de risco. O estudo mostra que uma em cada dez crianças de até cinco anos está com o peso acima do ideal (7% com sobrepeso e 3% com obesidade). Só em 2012, cerca de 356 mil crianças, de cinco a dez anos, foram diagnosticadas com obesidade. Em Minas Gerais, em 2008, foram registradas quase 14 mil  (6.34%)  crianças com sobrepeso. Já em 2022, o número se aproximou de 70 mil (14%).

 

Os dados são preocupantes. A obesidade em crianças e adolescentes resulta de uma série complexa de fatores genéticos e comportamentais que envolvem famílias e escolas. Se não tratada, pode causar problemas como infarto, inchaço dos vasos sanguíneos e acidente vascular cerebral (AVC). A nutricionista do Hapvida NotreDame Intermédica, Michele Arruda, reforça que além de diabetes e hipertensão, a criança acima do peso pode desenvolver problemas nas articulações. “O joelho é o mais prejudicado, pois o corpo não está estruturado para aquele perfil e esse excesso pode ocasionar problemas nos ossos. Outro problema comum é o desenvolvimento da apneia do sono, onde a respiração fica comprometida, pois o aumento de peso leva a uma pressão no diafragma, então, consequentemente o sono fica comprometido”.

 

A obesidade infantil, além de impactar na saúde física, também afeta a saúde mental da criança. “Há a questão da comparação de peso, da estética. Então essa criança acaba por se retrair, se excluindo também de alguns locais, tendo uma leve depressão. Ela se sente mal por não conseguir acompanhar o coleguinha durante uma brincadeira ou na prática de algum esporte, pois se cansa muito mais rápido que os demais”, explica a nutricionista.

 

Michele pontua que os principais fatores que desencadeiam a obesidade infantil estão atrelados ao estilo de vida da família. “Começa desde a introdução alimentar, com a oferta desde cedo de alimentos ultra processados, refrigerantes, doces, gorduras, excesso de sódio. Não há um equilíbrio. O sedentarismo também tem grande influência. Hoje em dia, o percentual de crianças que passam a maior parte do tempo na frente do computador ou celular é muito grande. Então, a família precisa ser o exemplo para essa criança, pois os filhos são reflexos dos pais. Se os pais têm hábitos saudáveis, consequentemente, seus filhos também terão. Durante a compra dos alimentos é primordial que os pais façam as melhores escolhas, sempre optando por alimentos nutritivos, pois isso vai impactar na saúde da criança”.

 

A especialista também ressalta que é importante respeitar a saciedade da criança, pois cada uma deve ser tratada de acordo com suas particularidades. “Há crianças que vão ter mais fome que outras e isso é algo que precisa ser respeitado. Aquele paradigma de antigamente de que criança que repete a comida, ou aquela que é gordinha é mais bonito de se ver precisa ser mudado. O importante é sempre manter uma alimentação balanceada, mesmo que a criança coma pouco, pois se não houver os devidos cuidados essa criança pode ter um risco de vida e um impacto negativo em sua vida adulta”.

 

O tratamento da obesidade infantil envolve um acompanhamento multidisciplinar, abordando todos os aspectos que envolvem a saúde da criança. “O nutricionista vai fazer a reeducação alimentar, orientando quanto a troca de alimentos que vão dar mais saciedade. Essa restrição alimentar no início é necessária. A palavra dieta em si assusta, pois muitas pessoas pensam que é passar fome, mas é apenas uma mudança para hábitos alimentares saudáveis que vão ajudar a chegar ao peso ideal. O psicólogo também ajuda na questão da saúde mental, pois a criança com obesidade possui uma ansiedade e compulsividade alimentar que precisam ser tratadas”, orienta.

Segundo Michele, é importante também direcionar para um profissional de educação física para que estimule o gasto calórico de forma prazerosa. “Atividades físicas tiram a criança do ócio e fazem com que elas não pensem apenas em comer. Por fim, há a atuação do endocrinologista que vai manter os padrões de normalidade dos exames laboratoriais dessa criança, eliminando todos os riscos de saúde”, comenta.

 

A nutricionista finaliza enfatizando a importância do equilíbrio alimentar. “Se você tem 80% de sua alimentação saudável e 20% envolvendo fast food ou doces, não vai impactar tanto na sua saúde. Mas se ela tem 90% de alimentação errada e 10% de alimentação saudável, isso vai influenciar na sua vida. Então é preciso organizar esse contexto, para que o futuro da população venha a ter saúde, já que as crianças estão adoecendo mais cedo e a probabilidade de longevidade está diminuindo”.